segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Sentindo-se vivo, vendo rostos de quem já morreu!

Mórbido o tema deste tópico? Talvez!
 
 
Enquanto preparava mais um cigarro na sua maquineta rústica, o autor do blogue, olhando a paisagem meadelense em redor de si, junto à casa que o viu nascer para este mundo e onde foi criado, tomou a decisão de dar um passeio pelas ruelas da aldeia, que hoje em dia é cidade, absorver os seus odores, mirar os seus tons, e quando os olhos se detiveram nas paredes cinzentas e lúgubres do cemitério que serve a freguesia, decidiu...
- Vou fumar um cigarro enquanto dou um passeio a pé e vou até ao cemitério, ver rostos de quem já partiu...alguém quer vir?
 
Já no caminho, na rua, o autor do blogue, viu-se acompanhado por seu pai; aqueles cabelos brancos, que em tempos já foram longos e negros como o céu nocturno, aqueles olhos verdes, de uma cristalinidade tal, dão, ao autor do blogue, um conforto pessoal, uma paz tal, difícil de almejar por outros meios que não sejam a companhia terna e calma do seu progenitor. Quão deliciosa se torna a marcha, quando acompanhados, falamos com aquele que um dia nos deu vida, nos deu alma, se sacrificou por nós, por vezes sem que o merecêssemos até e trocamos as conversas de homem para menino, por conversas de homem para homem! Delicioso! Há poucas coisas na vida tão puras, como o amor (quando verdadeiro e desinteressado), que um pai sente por um filho. Fantástico quando vimos aquele homem que toda a vida nos protegeu, e por nós comeu, por vezes, o pão que o diabo amassou; feliz, a discutir as mais variadas matérias com o seu filho! Desde o casario em redor de sua casa, os caminhos da aldeia, passando até, por matérias mais intimas.
 
No entanto com o aproximar da entrada do cemitério a conversa foi mudando, para se transformar radicalmente. Quando já no seu interior, num misto de roteiro pelos túmulos de quem já faleceu e que por um ou outro motivo, o autor do blogue desconhecia...a conversa foi fluindo:
 
- Olha (fulano de tal), lembras-te dele, era o senhor que... - e por aí em diante.
 
Num misto de satisfação e também alguma incredibilidade, o autor do blogue, talvez por estar naquele local, começou a pensar em como é bom estar vivo, precisamente, quando estamos ainda, na companhia dos nossos progenitores! E de repente, o autor do blogue, pensando, deu por ele achando que, realmente para que a vida tenha justificação, por ter sido vivida (pelo menos a bem), o cemitério, para além de um local de culto, torna-se um imenso jardim de recordações e fundamentalmente de justificações! A nossa vida, vivida a bem ou a mal, para isso existe o perdão final, caso a vida tenha sido vivida a mal; tem de ter uma justificação e no final de tudo, quando os olhos deixarem de alcançar a luz, sabe, o autor do blogue, vendo todos estes túmulos deste cemitério, que viveu, e que depois de morto estará ali a prova da sua vida, a tal justificação, para que a vida tenha ocorrido e alguém tenha existido. No final, caso opte por ser enterrado, o autor do blogue sabe que existirá inscrito numa lápide, um conjunto de caracteres que somados e lidos, resultarão no som do seu nome e (talvez) acompanhado também de alguns dizeres de alguém que lhe foi próximo, lamentando a sua morte e venerando a sua memória. Justificação para uma vida vivida! E ali, ao ver aqueles milhares de rostos estampados em fotografias coladas em lápides de pedra, o autor do blogue, ainda que se considere novo, mas vivo, logo condição única para que morra, esta é a nossa natureza, não adianta ludibriá-la, descobriu e sentiu que um dia, morrendo o corpo, o seu desejo será o de ser enterrado naquela terra, ou noutra terra qualquer, mas que tenha para o mundo uma lápide de preferência em ferro oxidado, sem símbolos, sem cruzes, sem imagens de santos e santas, nem senhoras nem cristos, nem tão pouco flores, pois as coitadinhas não precisam de morrer por um dia o autor do blogue ter morrido. Apenas uma lápide, simples, que tape a terra que comerá os seus ossos e onde nela figure o seu nome e uma fotografia de rosto, de modo a que esse mesmo mundo, atrás citado, possa descortinar que o corpo desse, que ali jaz, um dia viveu! Não! O autor do blogue não quer ser cremado! Ser cremado significa ficar confinado a uma caixinha de estanho, guardada num qualquer "baú de recordações", longe do mundo, longe de olhares, longe de quem passa e de longe de quem vê! Apenas quer que todos saibam que um dia viveu e foi feliz, a justificação encontrá-la-ão...numa lápide executada em ferro oxidado! A justificação final para quem um dia, viveu! Um "AQUI JAZ..."
 
Num turbilhão de emoções, o autor do blogue abandonou o cemitério, sempre na companhia do seu progenitor, calmamente, embora pesaroso, por ter visto tanta e tanta justificação de vida, e por saber, que mais cedo ou mais tarde, existirá num imenso e silencioso jardim, como este, o seu nome inscrito numa lápide, rasa e executada em ferro oxidado...
 
Sentindo-se vivo, vendo rostos de quem já morreu, o autor do blogue ainda sentiu mais carinho pelo seu progenitor, sentindo-o vivo, apesar daqueles cabelos já tão brancos...e que um dia foram tão negros!
 
 
Mórbido? Talvez! Mas foi mesmo isto que o autor do blogue sentiu...
 
 
 

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